domingo, 31 de julho de 2011

Vantagens Comparativas Para Leigos

Era uma vez uma família que tinha dois filhos, John e Paul (na verdade eram quatro, com George e Ringo. Mas estes ficam de fora desta história a título de simplificação). John tinha nove anos, Paul apenas seis e dormiam cada um no seu quarto. Todo dia de manhã, antes de irem para a escola, sua mãe pedia a cada um para  arrumar seu quarto, o que envolvia as tarefas de arrumar a cama e guardar os brinquedos. Como eles tinham idades e aptidões físicas diferentes, eles levavam tempos distintos para executar estas tarefas, como mostra a tabela abaixo:


Guardar Brinquedos
Arrumar a Cama
John
9 min
8 min
Paul
12 min
15 min

Como John era o mais velho e mais destro, ele conseguia executar as duas tarefas em seu quarto mais rapidamente que seu irmão mais novo. John então gastava 17 minutos enquanto que Paul gastava 27 minutos todo dia nas duas tarefas. O pai deles era um economista convencional, que gostava de contar histórias de economistas famosos à mesa do jantar. John gostava das histórias, e um dia ficou intrigado com a ideia de que trocas voluntárias sempre melhoram a vida das pessoas, que foi a moral da história que seu pai contou naquela noite. Isto não saiu da sua cabeça e ele foi dormir pensando a respeito.

No dia seguinte, pela manhã, John teve uma ideia e propôs a Paul o seguinte trato: Ele (John) arrumaria as duas camas enquanto que Paul guardaria os brinquedos nos dois quartos. Este trato envolvia uma troca de uma arrumação de cama pela guarda de brinquedos. John passou a gastar 16 minutos nas duas tarefas enquanto que Paul apenas 24 minutos. John economizou um minuto todas as manhãs, enquanto que Paul economizou três minutos por manhã. Ambos gostaram da nova situação pois tinham mais tempo disponível para brincar.

O que John e Paul descobriram foram o princípio de vantagens comparativas. John produzia cada uma das tarefas a um custo menor do que Paul, então ele tinha vantagens absolutas nas tarefas. Mas isto não impediu ganhos de trocas, pois John tinha uma vantagem comparativa em relação a Paul em arrumar as camas, pois fazia esta tarefa relativamente mais rápido, enquanto que Paul tinha uma vantagem comparativa para guardar os brinquedos.

John gostou tanto da engenhosidade da sua ideia que contou a seu pai o que aconteceu. Naquela mesma noite, seu pai explicou que o princípio de vantagens comparativas está por trás de todas as boas decisões no que diz respeito a trocas e especialização. Não precisamos fazer tudo o que consumimos, disse ele, podemos nos especializar naquilo que fazemos relativamente melhor e capturar ganhos por meio de trocas. E isto serve também para o comércio entre países: Vários países pequenos são ricos pois praticam comércio internacional e não produzem tudo que precisam. Seu sucesso está baseado na exploração de suas vantagens comparativas, finalizou.

Mas o tempo passou, os dois irmãos cresceram e desenvolveram novas aptidões, graças ao tempo extra ganho pelas trocas efetuadas todas as manhãs. John aprendeu a tocar guitarra e Paul piano, e assim desenvolveram novas vantagens comparativas. Eles montaram uma banda e ficaram famosos. Agora, eles não têm mais o problema de guardar os brinquedos, nem arrumam mais as suas camas, pois existem inúmeras fãs dispostas a fazê-lo. John e Paul ficaram ricos explorando suas novas vantagens comparativas, mas isto já é uma outra história.

Vantagens Comparativas e o Novo Desenvolvimentismo: Nenhuma Ligação ou Simplesmente Violação?

A teoria de vantagens comparativas talvez seja a mais difícil de entender, dentre todas da teoria econômica convrencional. Embora sua aplicação seja essencial para criação de valor e expansão de bem-estar, tanto no nível individual como em escala nacional e internacional, é curioso notar que mesmo economistas acadêmicos tenham dificuldades de compreensão, chegando a sugerir políticas de desenvolvimento que simplesmente ignoram a ideia de vantagens comparativas e, o que é pior, violam vantagens comparativas em sua implementação. Tome como exemplo este texto que busca definir o desenvolvimentismo brasileiro. Não há nenhuma menção a vantagens comparativas, mas isto pode ser apenas decorrente de ser um texto bastante simples, contendo uma mistura de declarações de boas intenções com interpretações esquisitas de artigos que, no seu devido contexto, são coerentes (veja, por exemplo, o texto que leva à nota de rodapé 5, leia o artigo citado e tente entender qual é a relação entre uma coisa e outra). Pegue também este outro texto, de autor novo-desenvolvimentista consagrado. Cheio de declarações de boas intenções, falácias do espantalho,  algumas aberrações como sugestão de política (como por exemplo taxar exportações para evitar o câmbio apreciado) e nenhuma referência explícita a vantagens comparativas. Talvez este texto específico não seja uma boa referência, no sentido de melhor descrever o que é o novo desenvolvimentismo, mas busquei alguns outros textos do mesmo autor e o nível do discurso é invariavelmente o mesmo. Espero então contar com a ajuda de algum leitor com indicação de texto melhor sobre o tema. Fica então a pergunta: Pode uma boa teoria de desenvolvimento ignorar ou mesmo violar o princípio de vantagens comparativas?

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Como Tornar Economia (mais) Relevante

James Hamilton comenta (motivado por um post instigante de Mark Thoma, que trata da relação entre economistas acadêmicos e outros):

"Too many of my colleagues pay too little attention to how markets and institutions actually function. The profession and our ability to offer constructive policy advice are seriously impoverished as a result."
Da perspectiva dos trópicos, não apenas poucos (quer dizer, menos do que seria desejável) economistas acadêmicos devotam seu tempo de pesquisa para entender o funcionamento real de mercados e de governos, mas como também alunos de pós-graduação têm pouco interesse em desenvolver uma melhor compreensão. Um sintoma típico é quando estes definem seus projetos de dissertação e tese a partir do uso de uma técnica (quero usar métodos não paramétricos para analisar uma série... ou quero usar o matlab para simular a política monetária ótima em uma economia fechada de agentes ricardianos...) em vez de a partir da definição de um problema econômico (como por exemplo, por que a taxa de juros no Brasil é tão alta, ou por que a produtividade no país é tão baixa, ou por que não se consegue investir em infraestrutura, etc.) 

Existe, de fato, entre alunos de pós-graduação, um fascínio natural pelas técnicas, que, diga-se de passagem, são importantes por fazerem parte do arsenal indispensável do economista. O problema não reside no desenvolvimento de competências técnicas, mas na falta de curiosidade de buscar entender melhor a natureza de problemas concretos, o que de certa forma reproduz a postura de seus professores. Sem uma postura mais adequada, continuaremos em debates estéreis sobre questões menos relevantes.

terça-feira, 26 de julho de 2011

A Cura da Doença Européia

A proposta de Guido Tabellini envolve a transferência substancial de soberania econômica dos países da União Européia (UE) para as autoridades da UE (a Comissão ou agências regulatórias), com o objetivo de evitar a acumulação insustentável de dívida. A criação de um governo central, cujo principal objetivo é prover seguro aos estados membros associado à imposição de restrições orçamentárias rígidas, aproxima esta proposta da do "Federalismo Preservador de Mercados", de Barry Weingast. A estruturação de reformas institucionais na Europa com base no FPM pode se constituir na cura da doença européia, ao limitar a capacidade dos estados membros de se engajar em políticas predatórias (como a acumulação insustentável de dívidas, por exemplo) favorecendo o fortalecimento de mercados com melhores perspectivas de crescimento econômico.

O Futuro do Crescimento Econômico do Brasil

Se Dani Rodrik estiver correto, as perspectivas do país são menos brilhantes do que se imagina. Talvez continuaremos a ser o país do futuro por muito tempo:

"...igniting and sustaining rapid growth requires something more: production-oriented policies that stimulate ongoing structural change and foster employment in new economic activities. Growth that relies on capital inflows or commodity booms tends to be short-lived. Sustained growth requires devising incentives to encourage private-sector investment in new industries – and doing so with minimal corruption and adequate competence."

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Herança Maldita

Sobre o legado político das ideias de Keynes, de acordo com John Taylor:

"Milton Friedman wrote a wonderful review essay on Keynes’ influence on economics and politics which touches on these issues and is still well worth reading. Friedman distinguished between Keynes’ political bequest—the advocacy of discretionary actions taken by powerful government officials—and his economic bequest—the emphasis on aggregate demand as a source of business cycle fluctuations. In the last section of the essay Friedman argues—quoting extensively from Keynes’ famous letter to Hayek on the Road to Serfdom—that the political bequest was very harmful while the economic bequest has many important insights."

A Doença Européia

Doença Européia diz respeito à crise das dívidas soberanas de países membros da União Européia, que pode levar ao contágio, a uma outra crise financeira e a uma nova recessão global. O pacote de auxílio financeiro à Grécia é útil pois causa um alívio nas tensões econômicas, mas apenas engenharia financeira para tratar do problema é insuficiente, é necessária uma reforma fiscal mais abrangente para tornar sustentáveis as políticas fiscais dos estados membros da UE e ajudar a prover estabilidade macroeconômica à região. Abaixo, a doença européia como vista por alguns dos mais influentes economistas:
- Giavazzi e Kashyap
- Nouriel Roubini
- Kenneth Rogoff
- Andres Velasco
- Tyler Cowen

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Frase do Dia

"Memo to young economists:  Don’t ever think you’ve come up with a new idea.  Unless your last name is Coase, you are almost certainly wrong.  Everything in macroeconomics keeps get rediscovered with each new generation."

Scott Sumner, ao mencionar artigo seu de 1995 - que requenta idéias tão antigas quanto 1818 - que antecipa artigo do Mankiw de 2003.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Febeapá Econômico e a Dissecação do Besteirol

Alex provê um serviço de utilidade pública ao dissecar uma peça exemplar do festival de besteiras econômicas que assolam o país. Leia a coisa toda, são quatro posts que revelam a tragédia da "teoria econômica" e "pesquisa econômica" que circula na mídia e em meios acadêmicos no país.

P.S. Meu computador travou e estou corrigindo este post somente agora, incluindo o link necessário.